Uma médica obteve na Justiça o direito à licença-maternidade pelo nascimento de sua filha. Ela é lésbica e vive em união estável com sua esposa, que é enfermeira. As duas trabalham para a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH).
A esposa gerou o bebê, enquanto a médica fez tratamento para também amamentá-lo. A EBSERH havia negado à médica o direito à licença-maternidade. No entanto, a 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região (BA) manteve a decisão da 37ª Vara do Trabalho de Salvador, concedendo o benefício à mãe. Ainda cabe recurso.
No processo, consta que a médica solicitou licença-maternidade pelo nascimento de sua filha. No entanto, a EBSERH negou o pedido.
No pedido administrativo, a empresa argumentou, para negar a licença, que não havia previsão legal para o caso e que o direito seria concedida apenas à esposa que gestou a criança.
A médica foi orientada a aguardar a decisão da diretoria de Gestão de Pessoas e da Consultoria Jurídica. Sem receber uma resposta e com o parto previsto para janeiro de 2024, ela decidiu ingressar com uma ação na Justiça do Trabalho.
Em sua defesa, a EBSERH alegou que a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) prevê o direito à licença-maternidade apenas para a mãe gestante, ou para quem adotar ou tiver a guarda judicial de uma criança. A empresa também afirmou que, no caso de adoção conjunta, apenas uma das mães teria direito à licença.
Decisões
Para a juíza da 37ª Vara do Trabalho de Salvador, o nascimento de uma criança em uma família formada por um casal do mesmo sexo garante os mesmos direitos e deveres de qualquer outro casal. Isso inclui o reconhecimento de ambos como pais ou mães, com todas as responsabilidades legais, como o de cuidado, educação e proteção.
Segundo a magistrada, a união estável e o casamento homoafetivos são legalmente reconhecidos, o que legitima a maternidade de ambas.
Para ela, a ausência de uma norma específica não impede o exercício da maternidade e dos direitos dela decorrentes. A juíza também destacou que a licença-maternidade não se limita à recuperação do parto, mas visa o fortalecimento do vínculo afetivo com a criança.
O tratamento desigual dado à mãe não gestante, “uma mãe que acaba de ter uma filha e a amamentará, acaba por resultar em uma conclusão perpetuadora das desigualdades”, refletiu a juíza, ao conceder a licença-maternidade.
Recurso
A empresa recorreu da decisão. A relatora do recurso, desembargadora Ana Paola Diniz, baseou-se em decisões do Supremo Tribunal Federal e no protocolo para julgamento com perspectiva de gênero, implementado pelo Conselho Nacional de Justiça, para embasar sua análise.
A desembargadora ressaltou que ser uma mulher lésbica não implica no reconhecimento de uma identidade de gênero masculina, destacando que os casos devem ser avaliados individualmente, sem estereótipos. “As particularidades devem ser examinadas caso a caso, e não com um padrão preconceituoso de que todas as relações homossexuais são iguais”, afirmou.
A relatora considerou inaceitável uma interpretação limitada dos direitos de casais homoafetivos. Conceder licença-maternidade apenas à mãe que gestou, quando ambas podem amamentar, disse a magistrada, cria uma distinção de direitos baseada em questões biológicas, o que gera uma desigualdade jurídica e desconsidera a proteção à maternidade da outra mãe.
A desembargadora manteve a decisão favorável à licença-maternidade, sendo acompanhada pelos desembargadores Renato Simões e Maria de Lourdes Linhares.
Fonte: Consultor Jurídico