Decisões recentes da Justiça do Trabalho de São Paulo e do Paraná condenaram empresas a pagar indenização por danos morais
Decisões recentes de Tribunais Regionais do Trabalho (TRT)s de São Paulo e do Paraná condenaram empresas a indenizar funcionários por danos morais por serem obrigados a manter a câmera do computador ligada durante toda a jornada de trabalho. Os desembargadores entenderam que a exigência das companhias expõe indevidamente a privacidade do empregado. Em duas decisões ainda cabem recurso.
Em São Paulo, a 6ª Turma do TRT foi unânime ao manter sentença que condenava uma empresa de tecnologia ao pagamento de R$ 10 mil por danos morais a uma funcionária, que durante a pandemia trabalhava na mesa da cozinha.
A companhia alegou no processo que não obrigava que se mantivessem as câmeras abertas. Ao analisar o caso, contudo, o desembargador Antero Arantes Martins destacou que a câmera não foi instalada para a realização do trabalho da empregada, que atuava no atendimento ao SAC por telefone, sem necessidade de visualização do cliente.
Para o desembargador, ficou caracterizado o dano à funcionária “que trabalhava em sua própria residência, sem a preservação de sua privacidade, em face da obrigatoriedade em desenvolver suas atividades com a câmera aberta, além de não ter sido fornecido pela ré o mobiliário adequado”. (Processo nº 1001785-67.2023.5.02.0074).
Uma loja de departamentos de Curitiba também foi condenada a pagar R$ 3,4 mil de indenização a um assistente de atendimento que trabalhou em home office, entre maio de 2022 a maio de 2023. O valor estipulado equivale a dois salários do empregado. Segundo o processo, sua atividade consistia em manter contato com clientes via WhatsApp e chat, além de ter reuniões com a supervisora, por videoconferência, para alinhamentos e recados. Porém, a supervisora passou a exigir que o trabalhador mantivesse a câmera ligada durante todo o expediente, para ter controle se estava trabalhando “de forma adequada”.
A 5ª Turma do TRT do Paraná foi unânime ao manter a condenação estipulada em sentença. Na decisão, o relator, desembargador Eduardo Milleo Baracat, afirmou que obrigar o trabalhador a trabalhar com a câmera aberta durante toda a jornada expõe, indevidamente, a sua privacidade. “Já seria constrangedor trabalhar com a câmera direcionada para o seu rosto durante toda a jornada, e não apenas durante as reuniões, onde a atenção está direcionada aos interlocutores do outro lado da linha. A fiscalização do trabalho, dessa forma, permite uma proximidade excessiva, permanente, sem filtros, que pode captar atos involuntários de intimidade do trabalhador.” (Processo nº 0001315-59.2023.5.09.0009).
Segundo o presidente do TRT Paraná, desembargador Célio Horst Waldraff, e professor de Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho na Universidade Federal do Paraná (UFPR), a Justiça do Trabalho tem a função de julgar casos referentes ao controle do trabalho, “principalmente de possíveis abusos na relação produtiva entre o capital e os trabalhadores, porque a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) é derivada de bases humanistas universais e dos princípios da Constituição Federal que continuam com ampla aplicação”.
A advogada trabalhista Juliana Bracks, do Bracks Advogados, afirma que uma coisa é ter a câmera ligada em reuniões online marcadas. Outra coisa é obrigar o empregado a manter a câmera desde o momento que logou até o fim da jornada de trabalho. Para Juliana, a mesma lógica se aplica ao presencial, no qual a empresa também não pode colocar câmera com vídeo e áudio na sala dos funcionários, para captar o que está sendo conversado. “O funcionário pode atender um telefonema pessoal ou falar com um colega algo de sua privacidade e a empresa não pode controlar isso”. Para ela, não é porque o funcionário está trabalhando que ele precisa ser permanentemente vigiado. “Isso é completamente invasivo e já seria presencialmente também”, afirma.
Fonte: Portal Jota