O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, pediu destaque, na última sexta-feira (4/10), e suspendeu o julgamento da ação na qual a Procuradoria-Geral da República contesta o tratamento diferenciado para a licença-maternidade com base na filiação biológica ou adotiva e no regime jurídico da beneficiária (celetista ou estatutário), além do compartilhamento desse benefício e da licença-paternidade entre os pais da criança.
Com isso, o caso será reiniciado em sessão presencial, ainda sem data marcada. Até então, a análise ocorria no Plenário Virtual, com término previsto para a próxima sexta (11/10).
Antes do pedido de destaque, apenas dois ministros haviam votado. O próprio Alexandre, que é relator do caso, rejeitou boa parte dos pedidos da PGR, mas votou para declarar a inconstitucionalidade dos trechos do Estatuto dos Servidores Públicos Civis da União e da Lei Orgânica do Ministério Público da União que estabelecem prazos menores de licença-maternidade em caso de adoção para servidoras públicas federais e membros do MPU.
Já Flávio Dino ampliou o escopo de seu voto e definiu que todas as mães — adotantes ou não, independentemente do vínculo laboral — têm direito à licença-maternidade de 120 dias, prorrogável por mais 60.
Contexto
No regime da CLT, empregadas que adotam alguma criança ou adolescente têm direito a 120 dias de licença-maternidade — mesmo período concedido às gestantes.
Já nos regimes dos servidores públicos da União e dos militares das Forças Armadas, a licença é menor em caso de adoção. O período é de 90 dias se a criança tiver até um ano de idade e de 30 dias se for mais velha.
No regime dos servidores do Ministério Público da União, a licença-maternidade em caso de adoção dura 30 dias e vale apenas para crianças com até um ano de idade.
De acordo com a PGR, são discriminatórias as diferenças estabelecidas pela legislação para a concessão das licenças em cada regime jurídico. Segundo o órgão, o benefício não depende do vínculo laboral ou da idade da criança adotada.
Outra regra apontada pela PGR diz respeito ao Programa Empresa Cidadã, que permitiu aos empregados das empresas participantes: a prorrogação da licença-maternidade para 180 dias; e a prorrogação da licença-paternidade de cinco para 20 dias.
A lei que instituiu tal possibilidade em 2008 também autoriza o compartilhamento da prorrogação da licença-maternidade com o pai da criança, desde que os dois sejam empregados de uma empresa aderente ao programa.
Na visão da PGR, a licença-maternidade e a licença-paternidade podem “ser usufruídos de forma partilhada” pelo casal, “com base no livre planejamento familiar”.
O órgão argumenta que a mulher tem o direito de compartilhar o período de afastamento, independentemente do vínculo laboral do pai da criança.
Voto do relator
Alexandre explicou que o Judiciário não pode “impor uma nova conformação normativa à licença parental não prevista no ordenamento”.
Por isso, o STF não pode estabelecer critérios idênticos de licença independentemente do vínculo laboral, nem permitir qualquer compartilhamento dos períodos de licenças pelo casal.
Desta forma, ele não conheceu da ação com relação aos pedidos de equiparação entre trabalhadores com vínculos diferentes e de instituição de um regime parental compartilhado — ou seja, sequer analisou tais pontos.
O relator ainda lembrou que, em dezembro do último ano, o Supremo, quando determinou ao Congresso a regulamentação da licença-paternidade no prazo de até 18 meses, não produziu “qualquer eficácia imediata para o reconhecimento da omissão inconstitucional”.
Assim, o magistrado adotou postura semelhante neste novo julgamento, “considerando as implicações que uma licença parental compartilhada teria para o debate a cargo do Congresso”.
Alexandre, todavia, concordou com a PGR quanto à inconstitucionalidade da diferenciação da licença-maternidade nos casos de adoção em alguns regimes jurídicos.
O ministro considerou que a Constituição não “limitou o alcance das normas protetivas da maternidade apenas à hipótese de maternidade biológica”. Pelo contrário: o artigo 227 estabelece a plena igualdade de direitos entre filhos biológicos e adotivos.
“A formação do vínculo familiar por meio da adoção está igualmente protegida pela garantia da convivência integral com a mãe de maneira harmônica e segura”, assinalou o relator.
De acordo com o magistrado, as normas contestadas são discriminatórias em relação à maternidade adotiva. Isso também contraria a jurisprudência do STF.
“Os dispositivos impugnados estão em nítido confronto com os preceitos constitucionais invocados, especialmente o dever de proteção da maternidade, da infância e da família, e o direito da criança adotada à convivência familiar a salvo de toda forma de discriminação”, concluiu.
Divergência
Dino também negou o compartilhamento da licença parental e acompanhou o relator com relação à inconstitucionalidade dos trechos das leis, mas ainda estabeleceu que todas as mães têm direito idêntico à licença-maternidade de 120 dias.
Diferentemente de Alexandre, ele conheceu de todos os pedidos e aplicou a técnica da sentença de perfil aditivo, na qual o Judiciário amplia o conteúdo de uma norma considerada insuficiente para estendê-la a um “grupo desprotegido” ou “bem jurídico negligenciado”.
Segundo ele, o Legislativo instituiu tratamento diferenciado entre pessoas com condições idênticas, o que configura “insuficiência legislativa” e gera “discriminação negativa”.
O magistrado entendeu necessária a intervenção judicial para “garantir a absoluta prioridade e o máximo interesse da criança”. Ele explicou que o objetivo é apenas estabelecer a igualdade entre os destinatários das regras.
Em seu voto, o ministro lembrou que a função principal da licença-maternidade é proteger o bem-estar da criança. “Nada justifica, portanto, que o legislador, no exercício da tarefa de concretizar esse direito fundamental, confira proteção menor ao filho adotivo do que ao filho biológico”, pontuou.
Na sua visão, “a natureza do vínculo profissional existente entre a mulher (gestante ou adotante) e a instituição onde presta serviços não podem ser utilizados como fator de discriminação” para a licença-maternidade.
Fonte: Consultor Jurídico